Apresentação
Como é possível um governo ou uma liderança política obter uma base de apoio social complacente com a defesa de um regime autoritário, assim como das violações aos Direitos Humanos por ele cometidas – censura, perseguições políticas, tortura, execuções sumárias, entre outras?
No Brasil dos fins dos anos 1970, momento em que se fortaleceram os movimentos de oposição à ditadura militar, a resposta dada pela sociedade a essa incômoda pergunta ganhou contornos redentores: “resistimos ao regime desde o seu princípio e os poucos que cederam assim procederam por conta da manipulação ou, no limite, do medo”.
Recentemente, novas versões vieram a público, demonstrando, com base em resultados de pesquisas acadêmicas, que parte significativa da sociedade brasileira não pautou as suas relações com a ditadura pelo viés da resistência. Pelo contrário, lidava com o regime de forma multifacetada e ambivalente, criando – por meio de complexas redes de apoios tácitos, jogos de acomodação, bolsões de silêncio, entre outros comportamentos benevolentes – uma atmosfera favorável à formação de consenso social, que, para além da propaganda e da repressão, contribuiu para a sustentação da ditadura durante a sua vigência.
Alinhada com essa perspectiva, a presente exposição, promovida pelo Portal do Bicentenário, em parceria com o Centro de Documentação e Memória da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Minas Gerais, se volta para 1972: ano em que o Governo Médici convidou o povo brasileiro para comemorar, no auge da euforia desenvolvimentista provocada pelo “milagre econômico”, os 150 anos de sua emancipação política de Portugal.
Inspirada no livro Celebrando a pátria amada: esporte, propaganda e consenso nos festejos do Sesquicentenário da Independência do Brasil (1972) e recorrendo a jornais e revistas disponíveis em fundo documental salvaguardado pelo Arquivo Nacional, a exposição busca lançar luzes sobre a complexidade das relações estabelecidas entre ditadura e sociedade. Faz isso por meio da abordagem de um evento chave da programação oficial do Sesquicentenário: a Olimpíada do Exército, ocorrida em Porto Alegre, entre 26 de abril e 07 de maio, sob a organização da Comissão de Desportos do Exército, com o intuito de promover o congraçamento entre civis e militares ao redor do ideal de “Brasil Grande”, mobilizando para tanto o esporte, além de uma vasta programação cívica e cultural.
No momento em que o país celebra, em tempos de atualização e recrudescimento de suas piores tradições autoritárias, o Bicentenário da Independência, a abordagem das comemorações de 1972 – em suas múltiplas facetas, incluindo a esportiva – parece ser, de fato, algo dotado de relevância. Não apenas por nos proporcionar uma melhor compreensão das peculiaridades e dos impactos dos usos políticos do “Dia da Pátria” ocorridos nos “anos dourados” do Governo Médici, como, também, em 2022: ocasião em que assistimos ao atual mandatário do Executivo Federal, imerso em expressiva crise de impopularidade, tentar capitalizar politicamente a efeméride, sobretudo com vistas à sua reeleição.
Desejamos a todas e todos uma boa exposição!
Bruno Rei, Ana Claudia Avelar e Andrea Moreno